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Jam Sem Terra

(MAS COM AS RAÍZES DE SEMPRE)

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(MAS COM AS RAÍZES DE SEMPRE)

A SATA não ata nem desata: um dia no aeroporto

João-Afonso Machado, 01.07.23

VISTA DO FAIAL.JPG

I - O RETORNO

De Lisboa ao Faial seriam 2 horas e 40 minutos de viagem. O avião da SATA partiu pelas sete da manhã e ainda não furara as nuvens todas já eu dormia, vindo do Porto, uma noite toda em claro. Ao meu lado um pai e o respectivo filho, miudito dos seus dez anos.

Não lembro quanto tempo me regalei no sono. Recordo somente o acordar à voz ampliada do comandante. Sinistramente. Ocorrera um «problema técnico» (nada de «alarme»...), pelo que, «por razões de segurança», tornaríamos a Lisboa.

O caldo estava virado. Ponta Delgada, decerto bem mais perto, oferecia pista boa para aterrarmos... Assim principiava a desgraça.

Sentiu-se bem o frenesim que a notícia infligiu no interior da nave. Sem gritos, sem exclamações, as pessoas desinquietavam-se nos lugares murmurantemente. Os comissários de bordo logo se aprestaram à sua missão tranquilizadora. Descontraídos, sorridentes, mentindo com os dentes todos - que íamos a Lisboa reparar e avião e voltávamos já... assim como quem fala de um furo no pneu e mais nada.

Seja como for, um homem não pestaneja. Tínhamos 40 minutos de voo até à Portela, segundo informaram. E nesses 40 minutos restava aguardar o que pudesse acontecer. Lá surgia um ou outro pensamento macabro, um sobressalto disfarçado se o avião começava a vibrar, mas o medo é inútil e de péssimo tom. O coração manteve o seu regular batimento...

A aterragem foi normalíssima. A rasquice ia começar.

II - O DESTINO?

O avião seguia cheio e todos já com a alma no arquipélago. O meu programa implicava uma rigorosa consonância de horários entre aeroportos e portos, era suposto andar por quatro ilhas em cinco dias. E foi isso mesmo que expliquei à gaguejante funcionária da SATA. Havia um outro voo para a Horta às 15 horas, o qual me servia perfeitamente. Mas o seu vaivém, sim-não, não-sim, obrigou-me a dizer-lhe com alguma severidade (a ela, por acaso mulata) - Seja clara comigo!

Perante o que a rapariga lá se viu obrigada a prometer-me um lugar nesse voo havendo vaga - caso contrário seguiria no das 18 horas para Ponta Delgada, já um imenso transtorno - e deu-me dois vouchers para almoçar e lanchar. E mastigava eu uma baguette com queijo serrano e presunto, abraçado a uma caneca de cerveja, ligam-me da agência de viagens - corresse aos escritórios da SATA tratar do cartão de embarque porque tinha lugar no avião das 15 para a Horta!

Torpedeei aeroporto fora, vindo à zona exterior. Descobri o barraco da SATA. E ouvi da zelosa cachopa do computador que afinal não, fora mais um engano... O meu tom de voz subia já, declararei aquilo tudo uma vergonha e lembrei-lhe que teria de ir para a fila novamente, descascar-me para a inspecção da mochila, do cinto, do telemóvel, das botas, desse streap-tease todo. Ao galhardo conjunto de funcionários posto na porta de embarque (um deles dizia que se eu tratara do assunto com uma agência de viagem, resolvesse o problema com ela - como se a passagem não estivesse já comprada à SATA!!!) tive a gentileza de, dedo apontado a cada um, lhes prometer apresentar uma queixa de todos.

O resto da tarde foi isto. Informações sempre contraditórias, o voo das 18 passou para as 19, depois para as 22 (desconfio que continuavam remendando o furo na roda do avião...), o pessoal da SATA refugiou-se no seu ninho fora da zona de embarque, contactei por telefone a SATA nos Açores - apesar de tudo muitíssimo mais atenciosos, mas sem se comprometerem - queria já voar de Ponta Delgada para S. Jorge, para recuperar do dia perdido, mas nada, nada, nada...até que extenuado, esfomeado, enervadíssimo e prestes a submergir na multidão, os ouvidos já disfuncionais, um dia inteiro enfiado no aeroporto - desisti. Dirigi-me ao acampamento da SATA, - Fará a fineza de passar para cá o livro de reclamações... - onde descarreguei tudo o que tinha a dizer e exigi reposição de dinheiros e indemnização. Por Lisboa me fiquei.

(Averiguei, entretanto. A SATA utiliza as latas de conserva que a TAP deitou fora. Ferro-velho no ar! Daí as recorrentes avarias, os protestos ignorando-se o risco de, um dia, um acidente fatal. Não se recomenda a SATA, salvo nos pequenos aviões que asseguram a ligação entre as ilhas - com pontualidade e outro género de pessoal. Para os Açores, com segurança, - por unanimidade dos opinantes, a Ryanair!)