A Volta na Senhora da Graça
É hoje o grande e decisivo dia. Mas já ontem em Fafe o Sr. Alípio, em casa, - Ó mulher, assa aí dois franguinhos que partimos para Mondim. Arma-se a tenda no alto da Senhora da Graça, não vou perder a chegada!...
Que não, que sim... - Qual não! Eu a chegar da loja com duas boxes de Pias!... Olha, não esqueças a geladeira...
De Fafe lá um instante. Ainda com uma pontinha de sol armaram o barraco e o Sr. Alípio, pintado de fato de treino azul, risca branca, alapado na cadeira de praia, já chuchava a primeira perna da galinha à mistura com o branco alentejano. Tocava muito alto o rádio naquele cimo do monte, a noute era de festança.
Foi uma melancia inteira também, e um tropeção final no cordame que ia deitando a tenda abaixo. Com algo de medievo nesses longes, algo a lembrar o resmonear dos ursos de outrora.
Agora, o calor estuporante e o Pias consumido até à última gota. Heureusement, a esposa, calhada em viagens longas aus Paris, não esquecera a reserva de mines.
O rádio anuncia, os primeiros ciclistas estão quase aí... O Sr. Alípio ergue-se a custo. O seu FêQuêPê estava arredado da prova. A camiseta sem mangas cola-se-lhe ao corpo - ceifa-a fora. E de xanatas e - vamos lá, haja boa vontade... - uns calções de banho, bandeira vermelha e verde dos chinenses fafenses nas mãos, lança-se à berma da estrada em polvorosa. No estertor dos três primeiros atletas.
- Ide, ide, carago! Ide! Força Portugal!
O concorrente mais loiro, possante, ainda profere algumas palavras imperceptíveis ao esquivar-se do pano que o Sr. Alípio drapeja. Este - chap, chap, chap - os dedos dos pés a lavrarem o asfalto, vai-lhes no encalço até à meta. E depois torna atrás, bufando, bufando, feliz - Ó Micas, este ano é que foi! - Sem mais querer saber do rádio onde Marco Chagas anuncia a vitória na Volta (afora qualquer milagre) de um denodado participante colombiano.