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Jam Sem Terra

(MAS COM AS RAÍZES DE SEMPRE)

Jam Sem Terra

(MAS COM AS RAÍZES DE SEMPRE)

Uma marca famalicense - SIM Chocolates

João-Afonso Machado, 29.09.23

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Se bem consigo reconstituir a história, o encontro deu-se em Hamburgo.  Assim longe, onde reside hoje a Emília, que serviu aqui em casa há 50 anos, e onde conheceu a Susana Azevedo, jovem empresária famalicense de chocolates artesanais, com clientela nesses inóspitos lugares. 

Tornaram-se amigas. Veio à memória da Emília o emprego doméstico de há tanto tempo. Nas próximas férias tornaria a Famalicão, tinha consigo o nosso recanto bem presente, cá comera e dormira. Telefonaram-me: se autorizava uma visita... Com certeza, autorizo, é só marcarmos o dia e a hora...

(A Emília igual, conservando sempre o seu sotaque transmontano, agora já avó. Foi um abraço, uma grande beijoca. E a oferta, a caixa de bombons.)

Era para mim novidade, desconhecia a marca. SIM - porque essas são as iniciais de Susana e da filha Maria Inês, sua sócia.

A embalagem é, além do mais, um manancial de informação, um catálogo legendado, ele há-os com e sem glúten, com e sem açucar, lactose, óleo de palma. E bombons vegan, até!

E a caixa foi toda, essa noite...

Restou o sabor, o telefone para encomendar mais, uma morada em Ribeirão, freguesia do nosso concelho... e um plano ainda fluído relacionado com o porto de mar de Hamburgo.

Em suma: muito obrigado e muitos parabéns aos SIM - chocolates!

 

Uma noite na Pousada da Juventude (Ponta Delgada)

João-Afonso Machado, 25.09.23

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Que a juventude está no espírito; que as datas não contam; que todos são bem vindos... Assim me deixei tentar pela estadia. Os hoteis perderam a cabeça e a chegada a Ponta Delgada era tardia, sem mais do que umas horitas de descanso antes do avião para S. Jorge.

O preço realmente excelente; o quarto de quatro camas (dois beliches); e os sanitários pertença da comunidade...

Eram as tais horitas só... De resto numa bela casa antiga senhorial, devidamente adaptada. A formigar de jovens de ambos os sexos e, se calhar, também dessoutros recentemente classificados. A menina da recepção, simpática e atenciosa, jamais me tratou por "avô". E pôs-me a chave na mão, indicou-me o quarto onde me instalaria no rés-o-chão do primeiro beliche.

Vim cá fora, bebi um Ucal e comi uma sandocha. Foi o meu jantar. Regressei e deitei-me, ainda sozinho, na expectativa das espécies exóticas que apareceriam a habitar aquele condomínio.

Não demorou surgiu um espanhol, autenticamente uma tatuagem andante, duas argolas, uma em cada orelha, alentado como um miura. Deixou umas roupas no cacifo e foi-se, não mais soube dele. Cabia-lhe o primeiro andar do segundo beliche.

E o que é mais: toda a noite ninguém chegou, solitário permaneci, com o grande alívio de qualquer condómino prudente.

De manhãzinha houve necessidade de me deslocar à casa-de-banho. Em cuecas corredor fora, abro a porta e... dou de caras com uma moça de nacionalidade não apurada. - It's only for ladies? - inquiri, aflito. - Both - respondeu ela secamente. E eu volvi ao condomínio, em busca da decência de um polo. De novo nos balneários, a rapariga entrara numa cabine e o namorado, junto a um lavatório, limava os calos em calções.

Só então me ocorreu estava descalço, de quantos atletas não teria já apanhado o pé? E fugi rapidamente. Para tomar banho, a utilização de uma toalha da Pousada custava 5 euros, o que veementemente recusei porque não colaboro em especulações. Por isso voltei, ainda em cuecas, com as botas a servirem de chinelos e todo o material de lavagem. Era agora a vez de uma bifa, bem compostinha, inexpressiva... - 'Morning - balbuciei, refugiando-me logo debaixo do chuveiro.

Enfim, outra vez no corredor, quase à porta do condomínio, pingando como quem mergulhou no mar, ia colidindo com uma mal-humorada senhora a caminho da sua higiene.

Vesti-me, vim ao pequeno-almoço e lá estavam elas todas na sala. Sepulcral silêncio! Foi o instante de meter uma bucha e largar Ponta Delgada fora por entre ruas, praças e jardins. Nunca mais! Antes a pensãozeca, mesmo dessas com a televisão no quarto só para enfeitar e o cilindro da água constantemente avariado.

 

Navegando de S. Jorge à Graciosa

João-Afonso Machado, 20.09.23

A partida foi pontual, manhã cedo. A dúvida da véspera era sobre a ondulação marítima, uma dúvida maldosa que se estendia à realização da viagem. Aliás chuviscava, o nevoeiro escondia bocados consideráveis das falésias e o vento de hoje contrastava com a quietude de ontem. Mas o ferry fez-se ao mar sem hesitações e muita gente a bordo.

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(Viera para as ilhas com uns Contos de Vergilio Ferreira e depois percebi porquê, quando li o autor preconizar «acontecesse, enfim, naquela manhã absoluta, qualquer coisa humana e íntima mais forte do que o silêncio e a ameaça».)

Deixar a terra para trás custa. Porque pela frente já só a submersão ou o destino. Todas as fichas tinham ido a jogo nas Velas (S. Jorge) e a aposta era a Graciosa. Através de águas mansas ou bravas, no curso de duas horas e meia e do sonho das baleias. E ante tantas interrogações eu passara a noite «ladrando furiosamente, como um rancor de cães ao tronco de uma árvore por onde a presa fugira» (V. Ferreira, uma vez mais).

Prisioneiros do oceano eram agora os nautas apontados à Graciosa, assistindo ao afastar da pétrea boia de S. Jorge.

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O ferry tomou a direcção do poente, ainda protegido por aquele molosso, mas vencida a Ponta dos Rosais

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foi o assobio à solta em que o vento se excomungou, mais o embate das ondas sempre e sempre e sempre. Muitos agasalhos em meu redor como quem se entretem com os dislates das gaivotas enquanto as baleias não ressuscitavam das águas.

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Um frio imaginário. A máquina fotográfica em riste, o polo apenas no calor da expectativa, à ré, contando o tempo de um retrato impossível do dragão em toda a sua amplitude. Ajudou o nevoeiro, encobrindo a cauda a nascente...

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Depois S. Jorge esfumou-se em sombras cada vez mais ténues. A ondulação tornou-se um hábito, os passageiros esqueceram o medo de se sentarem e somente duas ou três câmaras fotográficas vasculhavam o horizonte. Quanto mais a esperança nas baleias se afastava, mais se aproximava a imensidão do mar, o sentido de uma formiga perdida no cosmos. Os quartos-de-hora remavam sempre mais depressa... Assim foi que, de súbito, ladeávamos a Graciosa a bombordo e passámos a Baia da Engrade incrustada nos montes.

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E vieram também os picos rochosos nascidos não se sabe de onde, personagens de dramas antigos, madeira quebrada contra eles, caravelas a pique, vozes e pânicos que ainda ecoam.

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A amansar, o ilhéu da Praia. Já dono das suas ervas, decerto das suas posturas de ovos, de lagartos gulosos, do grasnar das aves. Lugar visitável.

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E a embarcação ia-se comedindo. A Praia, freguesia, à vista. Ou seja, o porto dito da Rochela. Ou o término da viagem. Nem o mundo nem o tempo nos couberam nos bolsos, muito menos as baleias ao alcance das objectivas. Mar crespo, cinzento, não seria o dia delas...

E no desembarque o vagar apenas para um retrato da praia da Praia (tanina, mas «uma certeza tão presente em todo o seu corpo, que era quase como se tivesse um destino» - V. Ferreira, ainda na ordem do dia),

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sobre a qual vale a pena estudar e meditar todos os seus prós e contras...

 

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