A casquinha do nome
Nessa manhã levantou-se voluntariosa e de ideias fixas na vassoura. Não porque o lixo se acumulasse mas apenas por ter acordado com ímpetos exterminadores.
A sala viveu então momentos conturbadíssimos, acossada por um impiedoso ataque de limpeza, e na rua, de passagem, houve quem se assustasse com o estilhaçado ruído de uma moldura da cómoda, degolada por um fanático espanador na sua sacrossanta luta contra o pó.
Sobreveio o silêncio, enfim. E uma maçadora comichão no nariz empinado em tantas certezas e pensamentos humanistas. Macaco não era, seguramente, os macacos não se passeiam à solta na cidade. Algum papelito transportado na ventania do aspirador? Tremeu ante a visão de uma hipotética barata ou de algum aranhiço. Ainda assim foi corajosamente lá com a unha do dedo mindinho e da sua narigueta retirou, muito enroscado, um nome de gente. Em letras negras, defuntas, que lhe maceravam a alma e transfiguravam a beleza dos seus dizeres e da sua fé nos povos. De resto, era o nome de um fugitivo de data longuíssima, um mariola, uma miragem somente. E aqueles carateres miudinhos uma casca, tal qual as ressequidas peles de que as cobras velhas se libertam primaverilmente - entupindo o seu apêndice nasal.
Deu-lhe um piparote e a pelicula foi indo suavemente para o chão, como se o nome das suas letras ainda ali fosse familiar. A fúria higiénica era ida, uma gaivota já obrara no varandim e o nome, sempre encarquilhadinho, foi empurrado com o pé para baixo do tapete.