A tarde toca e a multidão não debanda. Ouvem-nos ainda, a nós os três, tolos andados pelo planeta e chegados com alguns bocados de jazz na memória do ouvido. O que baste para o repertório de uma horita, talvez mais, e sempre vai valendo a pena, soam os metais das moedas sem a percussão dos impostos.
Velozmente, ou nem tanto, somos velhos. Hoje pedintes, com meios tocados de troca, amanhã esfomeados, nós os três, doutorados em sol e chuva e nas muitas teorias indiferencialistas. É assim, já não poderá deixar de ser assim.
Escuto e oiço aplausos. Trota menos mal a coisa... E por segundos sonho o sonho da fama e dos cachets bem alombados. Acordo num instante com a caixa das esmolas à vista. Sim, as esmolas, todos os dias as esmolas, a sopa da noite e uns copitos de vinho a aquecê-la...
Gozámos muito a vida, eu fui ferroviário até ser preguiçoso de profissão. Tão digna com outra qualquer. E bebi-a de um trago só, no intervalo em que aprendi a soprar o trompete. Dos meus companheiros sei o nada que eles sabem de mim. As palavras são para se pouparem e os abrigos dispersam-se na cidade. As histórias, uma mera invenção nos intervalos da sobrevivência. E o órgão um instrumento por enquanto com rodas e um tecto num vão de escadas. Depois disso talvez o fim da banda e do mundo também.
Mas quando a morte chegar - autorizado a falar por nós os três - que seja breve e muito eficaz. Com cada um às costas, correndo porta fora. E a Eternidade em que não acredito, algum passante a sustentará pela saudade, acima dos torrões que nos submergirão no oceano dos ignotos e esquecidos da crueldade do tempo.