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Jam Sem Terra

(MAS COM AS RAÍZES DE SEMPRE)

Jam Sem Terra

(MAS COM AS RAÍZES DE SEMPRE)

À despedida

João-Afonso Machado, 27.02.25

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Quando pedalávamos as nossas bicicletas, velho Amigo, não era assim. É certo, já todos os comboios tinham passado e só restava a ruína do apeadeiro. Lembras a escaqueirada ruína e os seus vidros estilhaçados, o putrefacto telhado? As paredes quase brancas que os anos mantinham diziam silenciosamente "Outiz", era o mês das andorinhas e o bastante para o seu ninho... Para nós, o prenúncio de cinco quilómetros a subir em bicicletas de antigamente e os anos... - raios partam os anos! - eram anos de pernas a dar aos pedais, cagão seria quem derreasse a meio.

Eram cinquenta anos para trás...

O descalabrado apeadeiro deu em bar, a nossa juventude na dos seguintes, tão todos um -  quão desengraçados. Até usam capacete... Já não é o nosso tempo, mesmo porque já estás fora do tempo....

Ficaram as pedras, as telhas afanadas, a via férrea ainda morna dos derradeiros comboios. Um adeus linha adiante... E ficou a eternidade do apeadeiro com a tua eternidade, as bicicletas que o meu Pai ralhava se intervalassem a descansar - Mas que merda de gajos são vocês?! - Ficou meio século em que, malandro, me tiravas do sério e incendiavas a minha pachorra.

É como se em Pindela bebessemos agora uma caneca de branco fresquinho. E, digo eu, - acomoda-te na varanda sem fim e dorme a tua sesta infinita.

Mas antes dá cá um abraço e desculpa dissídios recentes e mais qualquer coisinha. Meu velho, dorme, dorme, dorme sempre, como sempre gostaste de dormir.

No novo mundo

João-Afonso Machado, 19.02.25

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Passou, repassou, mas jamais trespassou. Tinha-se estabelecido por toda a vida feita de um eterno ir-e-vir.

Sem balcões nem divisórias. Sem quaisquer marcos, até. Havia arvoredo e um traçado estreito, o horizonte minimizava as contramãos. As horas somavam copas e ramagens, o esvoaçar das aves dos fins de tarde e as silhuetas acastanhadas ou esverdeadas dos monstros aquáticos que talvez povoassem aqueles terrenos alagadiços.

Assim encarava friamente a realidade para lá e para cá, sempre diferente de tão pendular. Vislumbrou montadas em trote largo e amazonas de cabeleira lindíssima e feições já distantes da sua geração; mais os cavalos todos que cabem dentro de um motor. Era quando se lembrava de não ser um sobrevivente. E o ruído parecia mesmo ganhar algum sentido.

Prosseguia até à noitinha. Então acontecia suar pesadelos de um mundo irreal, ultrapovoado de gente, sem jacarés nem jiboias, sem um sardão ao menos.

 

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