Barcelona ornitológica
O Mediterrâneo, de penedias escassas e águas plainas, não será o paraíso delas, das gaivotas. E decerto é assim em os mais mares que não cheiram a peixe e onde os barcos só sabem divertir-se em cruzeiros ou penar o transporte de contentores.
Apanhei uma mas no lago de um jardim público. Vagabunda, encostada à vegetação do rebordo na timidez de um ermita. Alva, santa, silenciosa, por pouco a deixava fugir.
Dos pombos de Barcelona direi que nada se parecem com os remelosos de cá. Na verdade são pombos-bravos descendo à cidade por umas bagas outonais nos renques de árvores nas avenidas.
Nem um nico daquele caminhar miudinho, tremido, meio assustadiço, a catar migalhas entre as mesas das esplanadas nas praças. Ao invés, pombos peitudos, com musculatura, despiolhados e esquivos e de voo firme.
Como eles grulhando, branca como a gaivota (conquanto alguns ornitólogos considerem a comparação torpe e aleivosa), a avis rara suporta bem o cativeiro fisico não transigindo na sua absoluta liberdade moral
Aprecia o ambiente urbano, em cujos varandins estranhamente se pendura horas a fio. Os seus ímpetos migratórios tornam-na menos visivel, salvo na época do acasalamento em que lhe aparece um traço negro entre as patas - a modo de uma cueca - e enceta estranhos bailados para captar a atenção do parceiro. O que tudo a torna extremamente vulnerável às fisgas da rapaziada, e por essa razão é já considerada em risco de extinção.