Fora do asfalto

Não é o tempo da sardinha. Hoje vai chicharro, quatro cabazes dele, graudinho e fresco, a sair do mar. Faço meia de duzia de lugares e o dia está ganho.
O triciclo em andamento numa meia volta rápida, uma roda traseira no ar, habilidade treinada que a canalha gosta e aplaude, as mães chegam logo depois, assim que ouvem a gaita a buzinar. O pior é esta maldita poeira em tanto andar na terra batida, o acelerador sempre a fundo, a gaita berrando como anho esfolado e o chicharro aos pulos na caixa, o sol a dar-lhe.
- Dúzia e meia, Sr. Abílio, a como está ele? - Ele está vivo e barato, Se'Balbina, são dez me'reis. - Ui! Barato? Só se for para ricos como vocemessê! - O que lhe sai caro são esses seus ganapos todos, Se'Balbina, não é o peixe...
E a digressão prossegue. Para trás ficou a Se'Balbina e o seu balde cheio. Será uma manhã com a faca a escamar e a esventrar chicharros, as tripas lançadas ao porco de engorda. Depois a benzê-los em farinha, a fritá-los enquanto na panela sobre a trempe a água fervente coze as batatas. O lar espalha o fumo e o cheiro do chicharro pela casa. Acalorada, a Se'Balbina despe o casaco de malha e poisa-o numa cadeira junto à mesa; vesti-lo-á mais tarde, às tantas dormirá com ele, o outono anda frio.
Por falar nisso, hei de passar pelo Zeca da oficina, a dar um jeito neste vidro do meu lado que não fecha. Não tarda chove, a gente fica toda molhada e tenho medo de o emperrar mais se o forçar.