Minês vai à caça

Foi um instante. Somente o tempo de o Outono passar e entrarmos no seguinte. Minês crescera, era uma senhora alta e elegante, de uma meiguice tocante. Nessa altura viviamos muito pelo Porto e a sua maturidade levou-me à arriscada aventura de uma caçada multiparticipada lá para as bandas de Beja. Em uma linha de quarenta caçadores com os respectivos cães. Se Minês se desorientasse, se se sentisse desamparada e se perdesse, aqueles longes alentejanos seriam um poço sem fundo. Bem podia eu mergulhá-los em sua demanda...
Mas tudo andou pelo melhor. As lebres eram muitíssimas esse ano e, nos primeiros momentos da caçada, saíram-me quatro, todas elas ficadas ali. Minês corria atrás das lebres e já as cobrava, voltando contente, muito ufana, a entregá-las na boca. Estava-lhe no sangue!
Foi quando me lembrei, um perdigueiro é um cão de parar, não é um coelheiro desenfreado. - Estou a estragá-la - pensei - deixando-a nesta brincadeira.
E assim me abstive de mais lebres. Doravante, só perdizes, que nenhumas chegavam ao meu tiro.
Minês ainda não se tornara a estátua marrada que depois foi. Mas cobrava com excelência. Recordo nesse dia duas perdizes, uma que levantou para trás, obrigando-me a uma rápida meia volta e a um tiro só que a deixou caída nos moutos; e outra, vinda no vento, largada e larguíssima, também tombada ao primeiro disparo. E Minês, prontíssima, a buscá-las, a bocá-las, a entregá-las em mão...
Uma caçada inesquecível! Fomos num dia e voltámos no outro e a dona do alojamento, muito amável, não teve senão condescender: a Minês dormiria no meu quarto, conforme o usual no nosso quotidiano.

